Violência no RN, que era um território pacato até uma década atrás, teve um crescimento vertiginoso a partir do 2º semestre de 2001
Foto: Emanuel Amaral
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Jovens com idade entre 15 e 24 anos representam
79,3% da população masculina que morre no Rio Grande do Norte vítima de
homicídios, acidentes de trânsito e outras causas não naturais. A proporção
supera a média brasileira (68,5%) e também é a mais elevada de todos os estados
do país.
Os dados foram publicados pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) na pesquisa sobre Estatísticas do
Registro Civil – 2013, divulgada no início desta semana.
Embora a sobremortalidade de jovens do sexo
masculino no Brasil não chegue a ser uma surpresa para o analista do IBGE
Ivanilton Passos de Oliveira, ele chama
atenção para o elevado número do Rio Grande do Norte e mais ainda para a
situação das mulheres.
“Nas pesquisas demográficas, já haviamos
identificado há muito tempo essa sobremortalidade de jovens na população de
homens, mas agora também vemos o crescimento de mulheres, dessa mesma faixa
etária, na estatística de mortes por causas não naturais entre a população
feminina. Elas estão começando a acompanhar os homens, o que é muito
preocupante”.
A pesquisa do IBGE comprova o que Ivanilton Passos diz. No Rio Grande do
Norte, do total de mulheres que morreram em 2013 vítimas de homicídios,
acidentes de trânsito, afogamentos, suicídios e outras causas não naturais,
46,9% tinham entre 15 e 24 anos - terceira proporção mais elevada entre todos os estados brasileiros e o
Distrito Federal. Nesse segmento, o RN só ficou atrás do Rio Grande do Sul
(55,6%) e Tocantins (50%). A média brasileira foi de 36,6%.
A pesquisa do IBGE também não surpreendeu o presidente do Conselho
Estadual de Direitos Humanos do RN, Marcos Dionísio, que defende que os
próximos governos, tanto no plano estadual como federal, tratem a pacificação
das comunidades brasileiras como prioridade.
Impunidade
“O desenvolvimento dessa enorme violência que a
gente vem tendo a cada ano, com mais de 50 mil assassinatos e 60 mil acidentes
de trânsito com vítimas fatais, jovens em sua grande maioria, nos leva a uma
convivência com a violência de tal forma que coloca em risco o próprio estado
de direito e a própria democracia. Não existe, na história da humanidade,
nenhuma democracia que tenha conseguido conviver com mais 100 mil mortes
relacionadas à violência”, diz Dionísio, que culpa a ineficiência e omissão dos
governos pela situação de violência.
Para o presidente do Conselho Estadual de
Direitos Humanos do RN, não é somente com investimentos em segurança que o
Estado vai resolver essa situação que ele considera uma “guerra civil”. “É
necessário que, inteligentemente, sejam concatenadas outras políticas públicas
– assistência social, saúde, educação, cultura, esporte e habitação”, diz.
Dionísio avalia que, nesse sentido, o Estado
tem feito muito pouco. É por isso, segundo ele, que a violência no RN, que era
um território pacato até uma década atrás, teve um crescimento vertiginoso do
segundo semestre de 2001 para cá.
O militante dos Direitos Humanos também faz
críticas ao trabalho de investigação dos crimes de homicídio, principalmente
quando as vítimas são pobres. “A investigação no Brasil é de uma ineficiência
que é um verdadeiro emblema da impunidade, e ela retroalimenta a nossa guerra
civil cotidianamente”, conclui Marcos Dionísio.
Os dados divulgados pelo IBGE surpreendem?
Esses dados não são surpresa para nós que
estamos acompanhando essa verdadeira guerra civil em que o Brasil está
encalacrado. E, no tocante ao Rio Grande do Norte, o número não só não nos
surpreende como, infelizmente, temos que anunciar que em 2014 esse processo se
agudizará. Nós temos hoje uma grande quantidade de assassinatos concentrados na
faixa etária entre os 15 e os 29 anos de idade, com enfoque mais forte entre os
15 e os 24 anos. Significa que o homem brasileiro perde a vida na plenitude da
força física, quando poderia estar contribuindo com o Estado, trabalhando,
estudando, sendo uma pessoa produtiva.
Quem são esses jovens dessa estatística?
Normalmente são jovens negros e pardos, pobres,
moradores da periferia. Eles habitam exatamente essa zona de exclusão, de
invisibilidade social. E as fontes que a gente vê veiculadas na mídia querem
nos fazer crer que todos são mortes em decorrência de disputas, de queia de
arquivo ou de disputa de território pelo tráfico. Nós achamos isso uma generalização perigosa. Muita gente
está acertando as contas com seus desafetos se utilizando de características
que matam a vítima uma segunda vez de uma forma cívica. Então é preciso que os
órgãos da área da Segurança Pública, sobretudo ligados à investigação,
investiguem cada um desses crimes, apontem os culpados para que eles sejam
julgados na forma da lei.
No RN, o problema da violência, sobretudo no
que diz respeito a políticas públicas voltadas para essas comunidades, tem
recebido a devida atenção dos governantes?
Tem sido feito muito pouca coisa no Estado. Por
isso que a violência no RN, que era um território pacato até uma década atrás,
do segundo semestre de 2001 para cá teve um crescimento vertiginoso. Ainda não
chegamos na metade do último mês de 2014 e já superamos as 1.666 ocorrências de
crimes violentos letais intencionais que foram cometidos no estado no ano
passado.
Tribuna do Norte
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