Escondido em uma enorme casa em Abbottabad,
Paquistão, Osama bin Laden pediu a seus seguidores na rede Al-Qaeda que se
concentrassem em atacar os Estados Unidos e evitassem uma luta interna entre
muçulmanos.
Documentos divulgados nesta quarta-feira (20)
pelo governo dos Estados Unidos revelam o estado de ânimo do fundador da
Al-Qaeda, seus debates sobre tática, a ansiedade com a espionagem ocidental e
sua obsessão com a imagem pública de sua organização.
"O foco deve ser matar e lutar contra os
americanos e seus representantes", escreveu Bin Laden em um dos documentos
agora revelados.
Agências americanas de inteligência tornaram
públicos nesta quarta-feira mais de 100 documentos encontrados no arquivo de
Bin Laden, depois que o Congresso determinou a divulgação e de críticos terem
acusado a CIA de esconder material.
A agência de notícias France Presse (AFP)
obteve acesso exclusivo aos documentos antes da divulgação.
Jeff Anchukaitis, porta-voz do diretor de
Inteligência Nacional, afirmou que a divulgação de uma boa parte dos documentos
obtidos na operação tem como objetivo cumprir com a determinação do presidente
Barack Obama de "mais transparência".
Mas também obedece a lei que obriga as agências
de inteligência a revisar todo o material sobre Bin Laden para sua possível
divulgação, destacou.
Os documentos aos quais a AFP teve acesso são
as traduções para o inglês feitas pela CIA, mas não houve condições de verificar
de forma independente a procedência do material nem a qualidade da tradução.
A divulgação do material acontece poucos dias
depois do premiado jornalista americano Seymour Hersh afirmar em um artigo que
a narrativa oficial de Washington sobre a busca e morte de Bin Laden está
repleta de mentiras.
Cuidado máximo com a segurança
Com temas que vão de discussões estratégicas e
teológicas até detalhes mundanos sobre administração ou medidas de segurança,
os documentos desclassificados nesta quarta-feira mostram a preocupação de
voltar a atacar um país ocidental, da mesma maneira como os Estados Unidos
foram atacados em 11 de setembro de 2001.
Consciente dos ataques com aviões não
tripulados (drones), Bin Laden se refere frequentemente a preocupações com a segurança
e aconselha os auxiliares a evitar o uso de e-mails.
Em outros documentos, Bin Laden critica os seus
seguidores por encontros em grupos numerosos e alerta sobre dispositivos
eletrônicos microscópicos que podem ser injetados em objetos ou roupas de
algumas de suas esposas.
Também se concentra em planos para desenvolver
um novo grupo de líderes dispostos a assumir os riscos, além de discutir
detalhes sobre a viagem clandestina de um de seus filhos e possível herdeiro,
Hamza, para o Paquistão.
Em uma das cartas, Osama Bin Laden menciona a
oposição pública nos Estados Unidos à guerra do Vietnã e argumenta que a única
forma de alterar a política externa americana é "começar a atacar a
América para forçá-la a abandonar estes governantes e deixar os muçulmanos em
paz".
Mas os documentos também revelam divisões entre
os militantes sobre como executar as campanhas.
Bin Laden alerta que conflitos com regimes no
Oriente Médio poderiam distrair os militantes de atacar o que considerava o
inimigo real: Estados Unidos.
Para um analista da inteligência americana, a
correspondência reflete a preocupação de Bin Laden "com a falta de união
dentro do movimento jihadista global, que pode levar a tendência a seu
desaparecimento".
Por exemplo, o líder da Al-Qaeda foi tomado de
surpresa pelas revoltas nos países árabes a partir de 2010, mas pressionou seus
auxiliares a aproveitar o momento de "revolução" para conseguir
penetrar entre os jovens muçulmanos.
EI e Bin Laden
O braço da Al-Qaeda no Iraque, que mais tarde
se transformaria no grupo radical Estado Islâmico (EI) para superar a própria
Al-Qaeda em influência, também aparece claramente nos documentos.
Bin Laden e seu então braço direito, Ayman
al-Zawahri, receberam duras críticas em uma carta de seguidores iraquianos, que
pediram uma denúncia do banho de sangue no Iraque.
A Frente Jihad e Reforma alertou Bin Laden em
uma carta de maio de 2007 que Deus o responsabilizaria por "abençoar o
trabalho realizado pela organização Al-Qaeda no Iraque, sem condenar os escândalos
que são cometidos em seu nome".
Nos documentos, Bin Laden também escreve sobre
operações em grande escala, mas seus seguidores encontram dificuldades para
organizar grandes ataques e, ao mesmo tempo, evitar as ações de drones e da
espionagem americana.
"Pouco antes de sua morte, Bin Laden
seguia concentrado em operações em grande escala, ao mesmo tempo que outros
líderes da Al-Qaeda acreditam que operações menores, ou o estímulo de ataques
de terroristas solitários, teriam êxito em sangrar o Ocidente economicamente",
afirma a mesma fonte da inteligência.
Bin Laden não conseguiu vencer a discussão.
Após sua morte, a liderança da Al-Qaeda passou a defender os ataques dos 'lobos
solitários'.
G1
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Reflita, analise e comente