Desde o século passado o Brasil tem desenhado
políticas, a fim de obter papel relevante em indústrias estratégicas. E obteve
sucesso em algumas delas, como o agronegócio, a aeronáutica e a indústria de
óleo e gás. Crescemos ouvindo falar de Embraer, Petrobrás e Embrapa. E
certamente voamos em jatos da Embraer, talvez usando querosene produzido pela
Petrobrás e, com quase 100% de certeza, comemos alimentos crescidos de sementes
produzidas com tecnologia da Embrapa.
Mas agora é preciso dar um novo passo e fazer
parte da indústria que hoje cria muitos trabalhos, trabalhos limpos e de
salários elevados: a indústria criativa. E quando falamos em indústria
criativa, o Vale do Silício é sempre a região que primeiro vem à cabeça.
Natural, pela força do ecossistema que possui, pelas gigantes de tecnologia que
criou. Só para citar as mais recentes e em muito destaque Apple e Google, com
valores de mercado acima de US$ 700 milhões e US$ 300 milhões, respectivamente.
Mas no mundo inteiro, vemos surgir protótipos
do que hoje é o Vale do Silício. Em diferentes níveis de maturidade e de
relevância para os seus países, mas de certa forma, tão vibrantes quanto o
Vale. Só para dar nome a alguns, hoje temos Boston, Londres e Israel. E por que
não falar também Pequim e Bangalore?
O Brasil não está de fora! Embora alguns
prefiram sempre ver o copo meio vazio, temos muito a dizer para este novo
contexto econômico... Sim, acho que começamos meio atrapalhados a tentar
ingressar neste cenário. A história, se me permitem, começa lá pela década de
80 do século passado, no tempo do Brasil Grande Potência, com a reserva de
mercado. Precisamente em 1984. A reserva impediu que os brasileiros, os que
aqui no Brasil estavam, tivessem acesso a produtos de informática que não
fossem produzidos por empresas nacionais, aqui no Brasil... Olhando em retrospectiva,
é fácil entender o quanto os consumidores foram penalizados e o quanto esta
política retardou o ingresso do país numa cadeia global de produção de bens de
informática...
Mas aprendemos... E em 1993, com a chamada Lei
de Informática, demos um largo passo. O mercado foi aberto gradativamente para
empresas globais que aqui chegassem para produzir e vender seus bens para o
mercado interno (também). E, mais importante, foi criado um conjunto de
benefícios, enormes benefícios, para aqueles que investissem em pesquisa e
desenvolvimento. Se a nova política é um sucesso ou não, há controvérsias, mas
podemos afirmar ao menos que os principais participantes desta indústria estão,
hoje, no Brasil.
A balança comercial de eletrônicos, no entanto,
permanece negativa. Atingiu a marca superior a US$ 30 bilhões nos últimos anos
e não dá sinais de que vai baixar. Apenas no ano passado, reduziu um pouco, mas
a economia foi mal e o consumo dos principais bens reduziu... Não foi pelo
aumento da nossa eficiência (ou autossuficiência no setor).
Mas, o que é inegável, é que as leis e
incentivos à pesquisa no país das últimas décadas estão longe de ser um
fracasso total. Os investimentos para pesquisa e desenvolvimento proporcionados
pelo arcabouço legal (somente com a Lei do Bem e a Lei de Informática foram
mais de R$ 50 bilhões na
última década) impulsionaram a criação de
importantes parques tecnológicos no país. E como resultado, temos hoje parques
no Brasil que cooperam com a indústria local e global, proporcionando (e
exportando através dos participantes globais) soluções inovadoras construídas
com conhecimento e capital humano local.
Apenas para dar alguns nomes e números, temos:
1- O Tecnopuc, em Porto Alegre, que conta com
mais de 6 mil engenheiros e pesquisadores em ciência da informação e
comunicação;
2- O Paque Tecnológico da UFRJ, no Rio de
Janeiro, com foco na indústria de óleo e gás, e que possui mais de 40 empresas
e 3 centros de pesquisa e desenvolvimento de empresas globais: EMC, Siemens e
GE;
3- São Pedro Valley, em Belo Horizonte, que tem
foco na criação de novas empresas de base tecnológica e conta hoje com 7
incubadoras e 4 aceleradoras;
4- O Porto Digital no Recife.
Para o Porto Digital, é preciso abrir um
parêntese. E também fazer uma ressalva: é lá que estou e lá que pretendo ficar!
O Porto Digital é um dos mais vibrantes parques que temos. Nascido há menos de
quinze anos, numa articulação que envolveu governo de estado, prefeitura e
organizações civis, o parque hoje conta com mais de 500 empreendedores, mais 7
mil empregos diretos e 250 empresas, que juntas faturam mais de 1 bilhão de
reais por ano.
Foi lá que surgiram empresas como o Livox, que
desenvolveu o melhor comunicador para pessoas com paralisia cerebral, de acordo
com as Nações Unidas; a Tempest, que tem escritório comercial em Londres e
provê serviços contra ataques cibernéticos em todo o mundo; e a SiliconReef,
que desenha circuitos impressos para aumento de eficiência de painéis solares.
É lá também, bem no coração deste parque, que está o CESAR, o Centro de Estudos
e Sistemas Avançados do Recife. Reconhecido e presente em todo o Brasil (além
da matriz em Recife, o CESAR conta com filiais em Curitiba, Sorocaba e Manaus)
é um centro com mais de 600 pessoas, e importantes contribuições para a
indústria de eletrônica de consumo, agronegócio, robótica social e tecnologia
de biossensores.
Em resumo, temos parques tecnológicos com
tecnologia e talento, em quantidade, provendo soluções inovadoras para empresas
globais, para (na maioria) o mercado local. É tempo de dar um novo salto, de
repensar como avançar, para concluir o que se pensou quando iniciamos o
movimento de inserção nesta indústria: o de construir a partir dos parques
empresas e produtos com inserção no mercado global.
Olhar Digital-UOL
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