Menos de 15 dias após assumir
o governo como presidente interino, Michel Temer se deparava com a primeira
crise na segurança pública. Para responder à repercussão de um estupro coletivo
no Rio de Janeiro, anunciou que criaria um departamento de combate à violência
contra a mulher na Polícia Federal (PF). Era a primeira de uma série de
promessas para reduzir a criminalidade feitas no primeiro ano do peemedebista à
frente do Palácio do Planalto.
Ao novo departamento na PF,
que nunca se concretizou, somaram-se outros anúncios, empacotados no Plano
Nacional de Segurança Pública, que foi lançado às pressas por conta de
massacres em série dentro de presídios no início deste ano. De concreto,
segundo balanço elaborado pelo GLOBO, o governo tem pouco para mostrar. A
atuação federal é apontada por analistas e gestores da área como meramente
reativa a crises pontuais.
CORTE NOS INVESTIMENTOS
INVIABILIZOU PROGRAMA
Carro-chefe do combate à
violência na esfera federal, o Plano Nacional de Segurança teve adesão formal
até agora de 12 estados, mas a implantação das ações só começou nas regiões
metropolitanas de Sergipe, Rio Grande do Norte e Rio Grande do Sul, segundo o
Ministério da Justiça, que gerencia o programa.
É que firmar a parceria não
garante, por si só, a execução dos programas previstos no plano, como
qualificação de pessoal, aquisição de equipamentos, fortalecimento da perícia,
entre outras ações. Um corte de mais de 40% nos recursos para investimento da
pasta da Justiça praticamente inviabilizou a execução do programa.
Sem conseguir atrair os
estados, o documento apresentado no Palácio do Planalto com a meta de reduzir
em 7,5% os homicídios dolosos em 2017 corre o risco de não passar de uma carta
de boas intenções. Presidente do Colégio Nacional de Secretários de Segurança
Pública, Jefferson Portela, que é titular da pasta no Maranhão, cobra mais
agilidade no detalhamento e implantação do plano nacional:
— Foi muito bom que o governo
tenha se predisposto a anunciar um plano de segurança, mas é preciso formatá-lo
melhor, pois ali só estão os pontos gerais. Depois disso, temos que trabalhar
na implantação — diz Portela.
Nem pontos específicos do
plano nacional referentes a órgãos federais, ou seja, que não dependem da
adesão de estados, têm sido efetivados a contento. A instalação de 837 câmeras
para a Polícia Rodoviária Federal (PRF), que só dispõe de 98 equipamentos
atualmente, "aguarda aporte de recursos", segundo o governo.
Classificado como
"acidente pavoroso" por Temer, o massacre num presídio de Manaus
marcou o início de rebeliões consecutivas que deixaram mais de 130 mortos
somente nos primeiros 15 dias deste ano. Os episódios colocaram, mais uma vez,
o governo federal no centro de uma crise na segurança pública.
Diante da barbárie que
repercutia internacionalmente, o Planalto se deu conta de que não adiantaria
repetir que, dias antes, havia liberado R$ 1,2 bilhão do Fundo Penitenciário
Nacional (Funpen) para os estados – recursos descontingenciados por
determinação da Justiça. Pressionado, o governo fez novas promessas, entre elas
a construção de mais cinco presídios federais, que está em compasso de espera,
ainda na fase de identificação de terrenos.
No âmbito da crise carcerária,
o governo criou a Força-tarefa de Intervenção Penitenciária, formada por
agentes prisionais federais e cedidos pelos estados. O mutirão foi enviado para
o presídio de Alcaçuz, região metropolitana de Natal, palco de uma das matanças
registradas no início deste ano, onde ficará até o próximo dia 25. O grupo é
apontado como peça fundamental na retomada da unidade, que passou vários dias
sob comando dos amotinados.
As Forças Armadas também
cederam homens para auxiliar na crise penitenciária. Segundo o Ministério da
Defesa, desde janeiro 4,2 mil homens vistoriaram 11 presídios de Roraima,
Amazonas, Rio Grande do Norte, Rondônia e Mato Grosso do Sul. Militares têm sido
empregados ainda em algumas situações específicas de violência nas ruas, como
aconteceu em fevereiro no Rio.
'MANDAR HOMENS NÃO É POLÍTICA
PÚBLICA', DIZ ANALISTA
O emprego dos militares nas
ruas, porém, é menos frequente que o da Força Nacional de Segurança Pública.
Formada por policiais e por bombeiros cedidos pelos estados, a tropa foi
empregada nove vezes na gestão Temer, sendo que oito operações continuam em
andamento, ou seja, foram renovadas. Cidades das cinco regiões do país
receberam a Força Nacional no período, numa prova de que a violência é
realidade nacional.
Para José Luiz Ratton,
coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Violência da Universidade
Federal de Pernambuco, é muito negativo que a Força Nacional, embora importante
em situações de crise, seja a principal vitrine do governo no combate à
violência:
— O que significa mandar cem
ou 200 homens para um estado? Serve apenas para dar uma resposta à opinião
pública. É uma medida inócua do ponto de vista de política pública.
Segundo Ratton, o governo
deveria aperfeiçoar o marco regulatório da segurança pública, condicionando
repasse de verbas e outros auxílios à produção de informações criminais e
policiais de boa qualidade, por exemplo.
— O problema é que as medidas
ocorrem sempre por causa de alguma emergência e, depois dos anúncios, ninguém
sabe se foram efetivamente implementadas — critica.
'EM ANÁLISE' E 'EM ELABORAÇÃO'
As primeiras medidas na área
da segurança anunciadas pela gestão Temer, devido a um estupro coletivo no Rio,
não saíram do papel. Ainda está "em análise jurídica" o pagamento de
diárias a policiais de folga para reforço do patrulhamento em áreas críticas.
Na ocasião, o então ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, afirmou que a
compra das horas de descanso dos agentes seria de rápida implantação, em
virtude de os estados estarem de acordo.
Outra medida anunciada foi a
elaboração de um protocolo unificado de atendimento a mulheres vítimas de
violência. Quase um ano depois, o Ministério da Justiça informa que o documento
está "em elaboração, contando com a participação da Secretaria de
Políticas para as Mulheres (SPM) e dos Conselhos das Polícias".
Procurado ao longo da última
semana para responder a críticas sobre as políticas de segurança, o Ministério
da Justiça, ao qual está subordinada a Secretaria Nacional de Segurança
Pública, não comentou.
Veja o estágio atual de cada
promessa para a Segurança anunciada pelo governo:
Diárias a policiais de folga
para reforço em áreas com histórico de violência contra a mulher e homicídios:
Em análise jurídica.
Protocolo unificado de
atendimento a mulheres vítimas de violência: Em elaboração.
Adesão dos estados ao Plano
Nacional de Segurança: Fase inicial em três estados (Sergipe, Rio Grande do
Norte e Rio Grande do Sul), com adesão formal de 12.
Instalação de 837 câmeras da
PRF: Aguardando aporte de recursos.
Construção de cinco presídios
federais de segurança máxima: Avaliação de terrenos da União, sendo que dois
presídios já têm área.
Repasse de recursos
contingenciados do Funpen aos estados para presídios: Valores foram repassados,
mas ainda não há projetos aprovados pelo governo federal.
Envio da Força Nacional a
estados em crise: Nove operações já foram deflagradas, das quais oito estão em
andamento.
Criação da Força-tarefa de
Intervenção Penitenciária: Foi empregada apenas no presídio de Alcaçuz (RN),
após massacre em janeiro.
Militares para inspeções em
presídios: Houve operações em 11 cadeias de cinco estados (RR, AM, RN, RO e MS).
O Globo
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