A inflação das carnes deverá
seguir pressionando o orçamento das famílias até a virada de janeiro para
fevereiro, mas o movimento é pontual e não muda o cenário mais geral da
dinâmica de preços, especialmente de serviços e bens duráveis, que segue
oferecendo espaço para mais uma queda na taxa básica de juros (Selic, hoje em
5,0% ao ano). A avaliação é do coordenador do Índice de Preços ao Consumidor
(IPC) do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas
(Ibre/FGV), André Braz.
Mais cedo, a FGV informou que
Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI) de novembro acelerou
para 0,85% em novembro, ante a alta de 0,55% registrada em outubro. Em meio ao
aumento das exportações para a China por causa do impacto da peste suína
africana (PSA) naquele país, a inflação das carnes foi destaque na aceleração,
tanto no atacado quanto no varejo.
“As carnes poderão continuar
subindo até lá pelo fim de janeiro, ou início de fevereiro, quando devem
apresentar alguma desaceleração. Essas deficiências de mercado não se mantêm
por muito tempo”, afirmou Braz, numa referência aos fatores que têm
impulsionado a demanda da China pelas carnes brasileiras.
O destaque entre esses fatores
é a PSA, que atingiu o rebanho chinês este ano, obrigando o gigante asiático a
importar mais. A demanda por carne bovina e de frango vai a reboque, dado o
tamanho do mercado da China, disse Braz. E o Brasil tem sido privilegiado como
fornecedor não só por ser o maior produtor global, como pelo fato de as
disputas comerciais atrapalharem as compras chinesas dos Estados Unidos e de
uma seca ter afetado a produção na Austrália. Além disso, a desvalorização do
real torna a carne brasileira mais competitiva.
Somado ao quadro favorável
para as exportações para a China, o aumento sazonal da demanda, marcado pelas
festas de fim de ano, formaram a tempestade perfeita sobre os preços das
carnes. Braz identifica no fim desse crescimento sazonal da demanda, no início
de 2020, o ponto de virada para a desaceleração da inflação das carnes – o que
significa a manutenção dos preços no novo nível mais elevado.
“Mesmo que as exportações se
mantenham em alta, há um limite para esses aumentos de preços”, afirmou Braz,
lembrando da demanda enfraquecida pelo baixo crescimento da atividade econômica
como limitador de repasses.
Segundo Braz, a desaceleração
da inflação das carnes será rapidamente sentida pelos consumidores, porque a
transmissão entre atacado e varejo é quase imediata – muito consumidas, as
carnes costumam ter estoques pouco elevados, que giram rapidamente.
No IPA-DI, componente do
IGP-DI que representa o atacado, a variação do preço médio dos bovinos vivos
acelerou de 2,85% em outubro para 15,63% em novembro. O preço médio da carne
bovina passou de uma alta de 5,18% em outubro para um salto de 13,73% em
novembro. No IPC-DI, que apura a evolução de preços no varejo, as carnes
bovinas aceleraram de 1,07% para 8,00%. Apenas o corte bovino “alcatra”
acelerou de 1,99% em outubro para 11,81% em novembro, enquanto o “chã de
dentro” passou de 2,42% para 10,9%.
Com isso, a carne bovina ao
consumidor já acumula alta de 13,39% nos 12 meses até novembro. A reboque, a
carne suína avança 12,87% em 12 meses, enquanto a alta acumulada no frango
inteiro é de 6,37%. De acordo com Braz, o “efeito substituição”, quando as
famílias aumentam as compras de outros tipos de carne quando os cortes bovinos
ficam mais caros, é o principal responsável pela contaminação da inflação para
as carnes suína e de frango. Além disso, a demanda maior da China ocorre em
todos os tipos de carne, lembrou o pesquisador.
Mesmo assim, segundo Braz, o
comportamento do “núcleo” do IPC-DI sustenta a percepção de que a inflação das
carnes tende a não se espalhar na economia, especialmente para os preços dos
serviços e dos bens duráveis. O “núcleo” (usado para mensurar tendências e
calculado a partir da exclusão das principais quedas e das mais expressivas
altas de preços) no varejo acelerou de 0,15% em outubro para 0,23% em novembro.
Em 12 meses, a alta acumulada é de 3,23%, ainda abaixo da meta de inflação
perseguida pelo Banco Central (BC), de 4,25% em 2019.
“Nada se alterou no quadro”,
disse Braz, completando que “tudo continua favorável” para mais um corte nos
juros.
Estadão Conteúdo
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