O secretário especial da
Cultura, Roberto Alvim, copiou uma citação do ministro de propaganda da
Alemanha nazista, Joseph Goebbels, em um pronunciamento. O vídeo foi divulgado
para anunciar o Prêmio Nacional das Artes, projeto no valor total de mais de R$
20 milhões.
Veja o que diz a citação de
Goebbels:
Segundo o livro “Goebbels: a
Biography”, de Peter Longerich, o líder nazista afirmou: “A arte alemã da
próxima década será heroica, será ferreamente romântica, será objetiva e livre
de sentimentalismo, será nacional com grande páthos e igualmente imperativa e
vinculante, ou então não será nada”
O que disse Roberto Alvim:
Nó vídeo divulgado pela
Secretaria Especial de Cultura ele afirma: “A arte brasileira da próxima década
será heroica e será nacional. Será dotada de grande capacidade de envolvimento
emocional e será igualmente imperativa, posto que profundamente vinculada às
aspirações urgentes de nosso povo, ou então não será nada”, discursou Alvim no vídeo
postado nas redes sociais.
Além do trecho copiado do
discurso de Goebbels, outra referência ao regime de Adolf Hitler é a trilha
sonora do pronunciamento: a ópera “Lohengrin”, de Richard Wagner. O compositor
alemão era celebrado pelo líder nazista e teve grande influência em sua
formação ideológica.
Procurado pelo GLOBO, Roberto
Alvim não retornou ao contato. Ele usou suas redes sociais para falar sobre o
assunto e classificou as semelhanças de seu discurso com o de Goebbels como uma
“coincidência retórica” mas defendeu que “a frase em si é perfeita”.
“O que a esquerda está fazendo
é uma falácia de associação remota: com uma coincidência retórica em UMA frase
sobre nacionalismo em arte, estão tentando desacreditar todo o PRÊMIO NACIONAL
DAS ARTES, que vai redefinir a Cultura brasileira… É típico dessa corja. Foi
apenas uma frase do meu discurso na qual havia uma coincidência retórica. Eu
não citei ninguém. E o trecho fala de uma arte heróica e profundamente
vinculada às aspirações do povo brasileiro”, escreveu Alvim.
‘Virtudes da fé alçadas ao
território da arte’
Em tom ufanista, Alvim anuncia
no vídeo o “renascimento da arte e da cultura no Brasil”. Depois de enaltecer a
fé do povo brasileiro e a sua ligação com Deus, o secretário falou sobre “poderosas
formas estéticas” que serão favorecidas. “As virtudes da fé, da lealdade, do
autossacrifício e da luta contra o mal serão alçadas ao território da arte.”
— Ele (Jair Bolsonaro) pediu
que eu faça uma cultura que não destrua, mas que salve a nossa juventude. A
cultura é a base da pátria. Quando a cultura adoece, o povo adoece junto. É por
isso que queremos uma cultura dinâmica e, ao mesmo tempo, enraizada na nobreza
de nossos mitos fundantes. A pátria, a família, a coragem do povo e sua
profunda ligação com Deus amparam nossas ações na criação de políticas
públicas. As virtudes da fé, da lealdade, do autossacrifício e da luta contra o
mal serão alçadas ao território sagrado das obras de Arte — disse Alvim.
Ele ressaltou ainda que o ano
de 2020 será “uma virada histórica”, ou seja, “o ano do renascimento da arte e
da cultura no Brasil”.
— Ao país ao qual servimos, só
interessa uma arte que cria a sua própria qualidade a partir da nacionalidade
plena. Portanto, almejamos uma nova arte nacional, capaz de encarnar
simbolicamente os anseios desta imensa maioria da população brasileira, com
artistas dotados de sensibilidade e formação intelectual, capazes de olhar
fundo e perceber os movimentos que brotam do coração do Brasil,
transformando-os em poderosas formas estéticas — acrescentou o secretário.
A pretensão não para por aí:
— São essas formas estéticas,
geradas por uma arte nacional que agora começará a se desenhar, que terão o
poder de nos conferir, a todos, energia e impulso para avançarmos na direção da
construção de uma nova e pujante civilização brasileira.
Na noite de ontem, o
secretário Especial da Cultura, Roberto Alvim, participou ainda da live do
presidente Jair Bolsonaro para anunciar o Prêmio Nacional das Artes, no valor
total de mais de R$ 20 milhões. Mais cedo, Dante Mantovani, escolhido de Alvim
para presidir a Fundação Nacional das Artes (Funarte), divulgou o orçamento de
R$ 38 milhões para investimentos em editais, publicações e reformas de equipamentos
ao longo do ano.
Depois de adiantar que
pretende lançar, em fevereiro, um edital para o “cinema sadio, ligado aos
nossos valores, com filmes sobre figuras históricas brasileiras e alinhando
conservadorismo e arte”, Alvim anunciou alguns detalhes do prêmio cujas
inscrições serão abertas ainda este mês. Com ele, o governo vai selecionar
cinco óperas (R$ 1,1 milhão para cada), 25 espetáculos teatrais de R$ 250 mil,
50 exposições individuais de R$ 100 mil nas categoria “pintura” e “escultura”,
além da publicação de 25 contos de R$ 25 mil, 15 histórias em quadrinhos de R$
50 mil e músicas de 25 compositores (R$ 100 mil para cada).
Em todas as áreas, os
contemplados devem ser das cinco regiões do país. A ideia, diz Alvim, é
oferecer os livros e as HQs de graça para a população, por exemplo.
‘Não é censura, é curadoria’
Na live (da qual participou
também o ministro da Educação, Abraham Weintraub), Alvim e Bolsonaro voltaram a
falar de “uma arte para a maioria” e a abordar a questão dos filtros temáticos
para obras que recebem fomento do governo. O secretário defendeu que “curadoria
não é censura”.
Em 2019:Bolsonaro fala em
extinguir a Ancine ‘se não puder ter filtro’
Ao começar a conversa com o
secretário na live (da qual participou também o ministro da Educação, Abraham
Weintraub), Bolsonaro disse que Alvim é a “cultura de verdade no Brasil” e
voltou a dizer que anteriormente existia “a ideia de fazer a cultura para um
minoria.”
— Nós nunca censuramos nada.
Eu me revoltei com muitos filmes, mandei suspender qualquer concessão (de
verbas), isso não é censura — disse o presidente, que teve o apoio de seu
subordinado.
— Não é censura, é curadoria —
disse Alvim.
O Globo
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