A proposta de reforma da
Previdência em discussão no governo, que será encaminhada ao Congresso Nacional
em, no máximo, 30 dias, atinge os atuais trabalhadores, com regras de transição
para reduzir os impactos para quem está perto de se aposentar. Somente não
seria prejudicado quem já está aposentado ou completou os requisitos para
requerer o benefício antes da mudança nas regras. Segundo interlocutores, a
medida é necessária para produzir efeitos rápidos e reduzir a pressão das
despesas dos benefícios nas contas públicas. Escalado no novo time da economia,
o especialista Marcelo Caetano assumirá a Secretaria da Previdência, tendo como
missão desenhar a reforma, dentro do Ministério da Fazenda. Ele é um defensor
da fixação de idade mínima para aposentadoria.
— Marcelo Caetano tem como
principal finalidade formular uma política de previdência no Brasil — disse
ontem o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, ao anunciar os nomes da sua
equipe.
Meirelles afirmou que ainda
não há proposta pronta — o que ocorrerá dentro de um mês, considerado por ele
um prazo “adequado” para que nada seja feito de forma “precipitada”. Apesar do
tom cauteloso, o ministro deu sinais sobre a linha geral da reforma, confirmada
por assessores do presidente interino Michel Temer, de que a mudança nas regras
valerá para quem está no mercado e não só para os futuros trabalhadores. Na
fala, o ministro chamou a atenção sobre a diferença entre direito adquirido e
expectativa de direito:
— Uma das questões mais
profundas e complexas que precisam ser analisadas é a que caracteriza o direito
adquirido e o que é meramente a expectativa do direito, baseada em normas que
vão ser discutidas no devido tempo. Existe um consenso que mais importante é
que exista uma Previdência Social que seja sustentável e autofinanciável, e é
que todos os trabalhadores tenham a garantia de que a aposentadoria será paga e
cumprida e que o estado será solvente para cumprir as suas obrigações. Vamos
estudar com cuidado e, para isso, a Secretaria da Previdência vem para o
Ministério da Fazenda, para trabalhar conosco, visando à garantia dessa
solvência do Estado e à sustentabilidade da Previdência Social como um todo.
Meirelles também deixou claro
que a proposta será debatida com as centrais sindicais e com parlamentares,
antes de ser enviada ao Congresso. Na segunda-feira, o governo decidiu criar um
grupo de trabalho, coordenado pela Casa Civil com representantes das centrais
para discutir o assunto, apesar da resistência dos sindicalistas às mudanças,
sobretudo ao impor mudanças aos trabalhadores que já estão no mercado.
GASTO DE R$ 496,4 BILHÕES ESTE
ANO
Segundo integrantes do
governo, uma reforma só para os novos trabalhadores teria efeito nas contas públicas
em 40 anos. Eles chamam a atenção sobre o gasto do governo com pagamento de
benefícios: só com INSS está projetado em R$ 496,4 bilhões neste ano — o que
consome 35,2% do total de receitas da União. A cifra, que hoje representa 7,95%
do Produto Interno Bruto (PIB), saltará para 17,2% em 2060, se as regras não
forem mudadas. Este ano, o regime deve fechar com rombo de R$ 133,6 bilhões, e
o próximo, em R$ 167,6 bilhões. Em 2015, o déficit foi de R$ 85,8 bilhões
(valores nominais).
Especialistas argumentam que a
reforma já está atrasada, diante do tamanho do gasto e do perfil demográfico
brasileiro. Eles afirmam que, para cobrir o rombo da aposentadoria, o governo
federal fica sem recursos para investir em educação e saúde.
— A despesa hoje já é muito alta,
e, diante da dificuldade em elevar a carga tributária e cortar gastos, as
contas públicas podem ficar inviabilizadas em período não muito longínquo —
disse o especialista em previdência e pesquisador do Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea), Rogério Nagamine.
Para Leonardo Rolim, consultor
da Comissão de Orçamento da Câmara e ex-secretário de Previdência Social, é
preciso criar regras novas para quem está no mercado e para quem ainda vai
ingressar.
— Para os atuais, é preciso
criar regras suaves de transição de modo que, quem estiver próximo da
aposentadoria seja o menos afetado possível, e quem estiver longe, mais. Uma
reforma só para os novos não tem potencial para assegurar a sustentabilidade do
sistema — disse.
O rápido envelhecimento da
população brasileira afeta as contas da Previdência. O sistema que vigora no
país é o de repartição, em que trabalhadores ativos ajudam a pagar os
benefícios dos aposentados. Segundo dados do IBGE, existem 11,8 idosos para
cada cem pessoas em idade ativa (15 a 64 anos); em 2060, essa proporção sobe
para 44.
Segundo Nagamine, a reforma
precisa ser ampla, com a fixação de idade mínima, e tocar em assuntos
delicados, como a revisão dos benefícios enquadrados na Lei Orgânica de
Assistência Social (Loas), que equivalem a um salário-mínimo ao idoso ou
deficiente da baixa renda e que contribuíram para o INSS em algum momento.
Esses gastos pularam de R$ 6,8 bilhões em 2002 para R$ 35,1 bilhões em 2014.
Pelas regras atuais, quem contribui por 15 anos, prazo mínimo, aposenta-se aos
65 anos, recebendo o mesmo valor.
Na visão dos especialistas, se
o governo enviar logo a reforma ao Congresso, há chance de aprovação no fim do
ano, após as eleições municipais. No entanto, a medida vai exigir força
política e articulação com parlamentares, diante da forte resistência a medidas
impopulares.
O presidente da CUT, Vagner
Freitas, disse que derrubar a reforma da Previdência será a principal bandeira
da Central. Ele disse que vai procurar as outras entidades para fazer um movimento
unificado contra as mudanças, independentemente de “posição ideológica”. E já
está programando manifestações em todas as capitais em junho:
— Vamos derrubar a proposta de
reforma da Previdência no Congresso e nas ruas. Vamos trabalhar juntos e
promover a unificação dos sindicatos contra a retirada de direitos.
A CUT se recusou a participar
do encontro com Temer na segunda-feira. O presidente da Força Sindical,
deputado Paulo Pereira da Silva (SD-SP), também disse que não fará acordo com o
governo e que a entidade não aceita mudanças para os atuais trabalhadores. Após
reunião com o presidente e Meirelles, ele sinalizou que poderá se unir à CUT.
O Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Reflita, analise e comente