O operador usado para abrir as
contas de Eduardo Cunha na Suíça é a conexão entre o dinheiro movimentado no
exterior pelo presidente da Câmara dos Deputados e o escândalo da Lava-Jato.
Luis Maria Pineyrua Pittaluga, que criou para Cunha uma empresa de fachada em
Cingapura, se apresenta como representante do escritório uruguaio Posadas &
Vecino Consultores. O escritório funciona na Rua Juncal 1305, 21º andar, em
Montevidéu, o mesmo endereço declarado como sede da Hayley S/A, investigada na
Lava-Jato por receber propina pela intermediação de contratos de fornecimento
de sondas de perfuração da coreana Samsung à área internacional da Petrobras.
Documentos divulgados ontem,
pela “Folha de S.Paulo”, revelaram que a principal conta atribuída a Cunha na
Suíça foi aberta com ajuda de Luis Pittaluga. Ele assina documentos como
diretor da PVCI New Zealand Trust, da Nova Zelândia. Esta empresa criou a
Netherton Investments, offshore de Cingapura que serviu de fachada para o
presidente da Câmara abrir a conta europeia.
Nos papeis da PVCI, Pittaluga
aparece como representante de Posadas & Vecino. É o mesmo escritório
uruguaio citado nas investigações sobre os pagamentos à Hayley. De acordo com
as informações prestadas pelo delator Júlio Camargo, representante do grupo Toyo
Setal, que atuava em parceria com o estaleiro coreano Samsung, uma conta da
Hayley na Suíça foi indicada por Fernando Antonio Falcão Soares, o Fernando
Baiano, acusado de ser operador do PMDB, para receber dois pagamentos no valor
de US$ 500 mil, cada, como propina pelos contratos de construção dos
navios-sonda Petrobras 10000 e Vitoria 10000, sem licitação, em contratos
firmados em 2006 e 2007.
Os depósitos para a Hayley,
segundo o delator, saíram da conta mantida por Camargo no Banco Cramer, na
Suíça. Em depoimento à Justiça Federal do Paraná, Camargo afirmou que foi
pressionado por Cunha a pagar um total de US$ 10 milhões em propina, dos quais
metade teria ficado com o deputado, para garantir o negócio.
Os investigadores da Lava-Jato
estão convencidos de que os depósitos na conta da Hayley são parte deste
montante. A operação também apurou que, a partir de certo momento, a Samsung
deixou de pagar as comissões a Camargo, que, por sua vez, suspendeu a propina.
Com isso, Cunha passou a pressionar a Samsung, valendo-se de requerimentos
apresentados à Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos
Deputados pela então deputada Solange Almeida em 2011.
Documentos levantados pelo
GLOBO, em cartórios do Rio e do Uruguai, demonstram que a Hayley é também uma
empresa de fachada. Fundada em 8 de dezembro de 2008, a empresa uruguaia não
tem sede própria — funciona na antiga sede da Posadas & Vecino Consultores
— e nem qualquer outro sinal de atividade. No 21º andar da Rua Juncal 1305, em
Montevidéu, uma placa informa que o escritório mudou-se recentemente para o
andar de baixo.
A Hayley é presidida pela
advogada brasileira Christina Maria da Silva Jorge. Em 23 de setembro de 2013,
ela assinou uma procuração ampla para José Reginaldo da Costa Filpi, para
representar a sociedade junto à Receita Federal no Brasil. Christina e Filpi
são sócios em escritório de advocacia no Centro do Rio. Investigações
concluíram que os dois administram um negócio que oferece serviços de
administração de empresas nas áreas jurídica, contábil e legal. “Para esse fim,
Filpi e seus colaboradores terceirizam serviços tanto no Brasil quanto em
outros países, como o Uruguai e o Panamá”, relataram os investigadores da
Lava-Jato.
A empresa uruguaia tem uma
filial brasileira, a Hayley Empreendimentos e Participações, cuja sede é a
mesma do escritório de Filpi, no Centro do Rio. Esta empresa comprou duas salas
comerciais na Rua da Assembleia 10. A partir de janeiro de 2013, passou a
funcionar no local a D3TM, consultoria que Renato Duque, ex-diretor de Serviços
da Petrobras, montou após deixar a estatal. Em novembro, a Hayley transferiu as
duas salas para a D3TM. Na papelada, consta que a transação foi feita por R$
770 mil.
No emaranhado de procurações,
aparece também o nome de João Antônio Bernardi Filho, ex-dirigente da
Odebrecht, que figura como sócio da filial brasileira da Hayley. Ele ocupou o
cargo de diretor-superintendente da Odebrecht Petroleo e Gás e também foi sócio
da Oil & Gas Service, fruto de uma parceria com o empresário Alexandre
Oliveira — Irani Carlos Varella, genro de Alexandre, é apresentado no site
“Memória Petrobras” como engenheiro que ocupou funções gerenciais na Bacia de
Campos, Petrobras Distribuidora e Cenpes. Ex-gerente-geral de Produção da
Exploração e Produção (E&P) e diretor de Serviços, Irani foi, de outubro de
2008 a fevereiro de 2013, presidente da Petrobras Uruguai.
Um dos depósitos de Júlio
Camargo à Hayley, em 4 de outubro de 2011, no valor de US$ 500 mil, ocorreu um
dia antes de um não esclarecido assalto sofrido por Bernardi no Centro do Rio.
A polícia não conseguiu saber onde foram parar R$ 57 mil dos R$ 100 mil
roubados do empresário na entrada da galeria que dá acesso ao BNDES.
Até agora, a conexão mais
forte entre a movimentação financeira de Cunha e o duto de suborno da Lava-Jato
tinha sido o depoimento do empresário João Henriques, lobista ligado ao PMDB.
Após ser preso, ele contou à Polícia Federal que abriu uma conta na Suíça para
pagar propina ao presidente da Câmara, para garantir um contrato da Petrobras
relativo à compra de um campo de exploração em Benin, na África.
De acordo com as
investigações, o dono do campo de petróleo em Benin, Idalécio de Oliveira,
recebeu US$ 34,5 milhões da Petrobras pelo negócio. Idalécio repassou US$ 10
milhões a Henriques. O lobista, então, teria distribuído a propina. Os
procuradores dizem que 1,3 milhão de francos suíços foram para uma das contas
de Cunha na Suíça em cinco repasses em menos de um mês.
O Globo
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