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Placas com a bactéria E. coli,
em um laboratório da Alemanha - REUTERS / FABIAN BIMMER
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O gene mcr-1, que causa
resistência a uma classe de antibióticos utilizada para tratar infecções por
bactérias multirresistentes, foi identificado pela primeira vez no Brasil em
cepas da bactéria Escherichia coli isoladas de animais de produção. Os
pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo,
responsáveis pela identificação, também reportaram o primeiro caso de infecção
humana no país, ocorrido em um hospital de alta complexidade em Natal, capital
do Rio Grande do Norte.
— A aparição desse gene no
Brasil pode contribuir para o surgimento de bactérias totalmente resistentes
aos antibióticos, com risco de enfrentarmos uma situação similar ao que foi a
era pré-antibiótica, quando doenças comuns, como uma infecção urinária ou um
ferimento profundo na pele, levavam facilmente a óbito — alertou Nilton
Lincopan, coautor dos estudos publicados nos periódicos “Eurosurveillance” e
“Antimicrobial Agents and Chemotherapy”.
A cepa da bactéria é
resistente à Colistina, ou polimixina E, um dos mais poderosos antibióticos,
considerado o último recurso no tratamento de infecções produzidas por
bactérias multirresistentes. A droga foi descoberta em 1949, mas foi
descontinuada entre 1970 e 2000, por causa da elevada toxicidade, ficando
restrito ao uso veterinário.
No início do século, por causa
do surgimento de bactérias resistentes a praticamente todos os antibióticos
beta-lactâmicos, como as penicilinas, a Colistina voltou a ser utilizada como
última alternativa terapêutica no tratamento de infecções produzidas por
microrganismos multirresistentes, principalmente associadas a surtos de
infecção hospitalar. A comunidade médica acreditava que o desenvolvimento da
resistência contra essa droga seria um processo difícil, o que não aconteceu.
— No fim do ano passado, um
artigo alarmante foi publicado na revista “Lancet Infectious Diseases“, em que
pesquisadores chineses descreveram a identificação de um novo gene (o mcr-1)
que confere resistência contra polimixina E e polimixina B — disse Lincopan.
Em maio, o gene foi
identificado em cepas de E. coli nos EUA. Países da Europa, da Ásia e da África
também já tiveram casos registrados. Uma das maiores preocupações das agências
de saúde é que o gene é facilmente transferível entre espécies bacterianas.
Estudos já identificaram o mcr-1 em cepas de bactérias clinicamente
importantes, como Escherichia coli, Salmonella spp. e Klebsiella pneumoniae.
— O aspecto mais assustador
sobre o gene é a facilidade com que ele é transferido entre diferentes espécies
bacterianas — disse Lincopan. — Consequentemente, algumas bactérias
hospitalares têm alinhado este gene junto a outros de resistência a
antibióticos, favorecendo que a espécie bacteriana receptora fique resistente a
praticamente a totalidade dos medicamentos. Assim, se um paciente estiver
gravemente infectado, por exemplo, por uma E. coli, não haverá nada que se
possa fazer.
Bactérias carregando o mcr-1
foram encontradas tanto em humanos como em animais de produção, levantando
suspeitas sobre a existência de uma cadeia de disseminação da resistência à
Colistina, que começa no uso do antibiótico no tratamento de animais,
propagando para os animais abatidos, alimentos derivados e o meio ambiente como
um todo. Na agropecuária, a Colistina é usada como promotora do crescimento.
— No Brasil, no início deste
ano, nosso grupo de pesquisa identificou pela primeira vez a presença do gene
mcr-1 em animais de produção das regiões Sudeste (São Paulo e Minas Gerais) e
Sul (Paraná e Santa Catarina), o que deve ser considerado uma urgência
epidemiológica e um alerta para as implicações no agronegócio, visto que o país
é um grande produtor e exportador de produtos de origem animal — alertou o
pesquisador.
O Globo
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