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O ex-presidente da Câmara dos
Deputados Ibsen Pinheiro, em entrevista à Agência Brasil (Foto: Fábio
Pozzebom/Agência Brasil)
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Presidente da Câmara dos
Deputados no primeiro e até então único processo de impeachment após a
Constituição de 1988, o ex-deputado Ibsen Pinheiro disse, em entrevista
exclusiva à Agência Brasil, que vê “algumas semelhanças” e “grandes diferenças”
entre o afastamento do ex-presidente Fernando Collor de Mello e o atual
processo contra a presidenta Dilma Rousseff.
Para Ibsen, o processo de
impeachment é eminentemente político. “Os grandes eventos que motivaram a
indignação popular não estavam na prova dos autos”, lembrou em relação à
cassação de Collor comparada às chamadas pedaladas fiscais, centro da atual
denúncia. “Em compensação, alguns fatos que não estão na denúncia têm grande
impacto, como por exemplo a delação do senador Delcídio [do Amaral]”, afirmou o
ex-presidente da Câmara.
De acordo com Ibsen Pinheiro,
“por mais facciosa que possa ser” a atuação do atual presidente da Câmara,
Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o peemedebista não tem o “condão” de definir os votos.
“Por mais que o presidente da Câmara possa ser um político influente, não cabe
a ele decidir a votação”.
Declarando-se “desencarnado”
da vida política, o ex-parlamentar afirmou que não virá a Brasília para
acompanhar o desfecho do segundo processo de impeachment depois da
redemocratização do país. “Não voto, logo não me meto. Eu desencarnei”.
Agência Brasil - Passados 24
anos da decisão da Câmara que deu início ao processo de impeachment do então
presidente Fernando Collor de Mello, em 1992, como o senhor analisa o atual
momento da Câmara e o processo que pode resultar no afastamento da presidenta
Dilma Rousseff?
Ibsen Pinheiro - Vejo
semelhanças, mas também diferenças. A primeira semelhança que vejo é o desgaste
do governo Collor e do governo Dilma. Desgaste de sentimento majoritariamente
estabelecido de insatisfação. A outra é que os dois presidentes, de então e de
agora, não têm, não sei se diria, jeito ou gosto pelo jogo político, aquele que
é importante com o Congresso Nacional para formar maioria, manter maioria. Isso
é uma atividade que se faz com gosto ou não se faz. Imagino que essas
semelhanças são, na minha avaliação, claras. Embora haja diferenças.
Agência Brasil - Mas Collor
não tinha apoio e a Dilma tinha e está perdendo...
Ibsen Pinheiro - A semelhança
que apontei é de haver [por parte dos dois presidentes] dificuldade da
convivência [política], principalmente com o Parlamento. Os dois.
Agência Brasil - E as
diferenças?
Ibsen Pinheiro - A diferença é
que o Collor foi eleito por uma legenda de três letras [PRN], que ninguém mais
lembra quais são. Já a Dilma foi eleita por um grande partido, que tem
ramificação, inserção social e que tem militância. Essa é uma diferença
importante que se percebe agora. No tempo passado, o presidente ficou
completamente isolado. Agora, você pode dizer que a presidenta é minoritária,
mas não pode dizer que ela está isolada.
Agência Brasil - A militância
do PT pode ajudar a presidenta, diferentemente do PRN em 1992?
Ibsen Pinheiro - A principal
diferença é que o Collor não tinha ninguém do lado dele quando chegou ao
processo final. Foi praticamente unânime a votação. A presidenta Dilma está
claramente minoritária, mas ela tem ao seu lado um partido que tem tamanho, ramificações
e articulação. Essa é uma diferença importante. O grau em que ela influi, vamos
saber domingo [17], no fim do dia.
Agência Brasil - Hoje, um dos
autores do pedido de impeachment contra Collor, o ex-presidente da Ordem dos
Advogados do Brasil Marcello Lavenère, discorda do processo contra Dilma. Quais
as diferenças que o senhor percebe entre os dois momentos?
Ibsen Pinheiro - As opções
pessoais têm que ser respeitadas, mas elas têm a ver com a visão política de
cada um. Daquele episódio, o presidente da OAB assinou em nome próprio, mas ele
estava, de fato, representando a entidade. Oficialmente, não porque o pedido de
impeachment tem que ser feito por um cidadão e não por entidade. Mas o
simbolismo estava no presidente Lavenère e o presidente Barbosa Lima Sobrinho,
da ABI [Associação Brasileira de Imprensa]. Nesse aspecto, a opinião do
presidente Lavenère é pessoal e respeitável, mas a OAB [atualmente] tomou uma
posição que não pode ser ignorada. Isso tem muita significação, partindo de uma
entidade do prestígio da OAB. Mas a assinatura do requerente é um dos
componentes do impeachment, nem é o mais importante. O mais importante são os
aspectos técnicos e jurídicos, a definição, em tese, do crime de
responsabilidade, para que depois seja feita a averiguação da autoria ou não. O
outro elemento é o político-popular. Sem os dois elementos não se pode falar em
impeachment.
Agência Brasil - Como o senhor
avalia o atual pedido de impeachment? As chamadas pedaladas fiscais justificam
o afastamento da presidenta?
Ibsen Pinheiro - A atuação do
presidente Eduardo Cunha, por mais facciosa que possa ser, ela não tem o dom de
alterar a definição, em tese, do crime de responsabilidade. A sua prática é
outra parte. Depende do processo e da prova. Mas tudo começa com a definição em
tese. No caso do presidente Collor, vamos lembrar que o episódio que configurou
o crime de responsabilidade foi algo menor, a compra de um carro popular, um
Fiat Elba. Agora, os grandes eventos que motivaram a indignação popular não estavam
na prova dos autos, como a entrevista do irmão dele [Pedro Collor] para a
Revista Veja e a entrevista do motorista [Eriberto França] para a Revista
IstoÉ. Agora, também: o episódio das pedaladas não tem grande significação.
Pode até ser crime de responsabilidade, mas não tem grande representação. Em
compensação, alguns fatos que não estão na denúncia têm grande impacto, como
por exemplo a delação premiada do senador Delcídio [do Amaral].
Agência Brasil - Mas houve a
rejeição da inclusão da delação no processo...
Ibsen Pinheiro - Mas ela não
faz parte do processo. Em um processo político, o juiz, que é o deputado, vota
pelas razões que quiser. O juiz [magistrado] tem que usar as provas pertinentes
e válidas. No processo político, o deputado vota porque não gosta do presidente
ou vota a favor porque é companheiro do presidente. Isso, em juízo, não tem
sentido. No processo político, o conjunto das circunstâncias pesa sempre para o
bem e para o mal.
Agência Brasil - O governo
está questionando supostos erros na condução do processo e cerceamento de
defesa...
Ibsen Pinheiro - Temos que
distinguir a alegação do fato. A alegação de cerceamento da defesa é aplicável
ao processo. Se houve ou não, vai caber ao Judiciário, diante dos fatos,
concluir. Uma violação da Lei Orçamentária, em tese, é crime de
responsabilidade. Se foi praticado ou não, é fato. É outro aspecto. Quando se
alega cerceamento de defesa, está se apontando uma causa de nulidade. Mas se
exige a comprovação da matéria que vai a exame do tribunal.
Agência Brasil - O senhor vê
semelhanças entre o então presidente Ibsen Pinheiro e o atual presidente,
Eduardo Cunha?
Não sou a melhor pessoa para
comparar o presidente daquela época e o de hoje. Eu escuto comparações, mas não
faço. Mas posso falar do deputado Eduardo Cunha. Creio que ele tem
vulnerabilidade grande, o que questiona sua ação política e parlamentar. Mas
uma coisa ele não tem condições de fazer: decretar a aprovação ou rejeição do
impeachment. Por mais que o presidente da Câmara possa ser um político
influente, não cabe a ele decidir os votos. Ele não tem o condão de interferir
porque a legalidade é muito estrita. A ordem da votação agora vai ter que se
sustentar no Judiciário se não for a legal. Qualquer outro procedimento tem que
estar de acordo com lei. A única coisa que não precisa lei é a motivação do
julgador. Porque o deputado e o senador não precisam justificar seu voto nem
fundamentá-lo. E o conteúdo do voto é irrecorrível. Se o Senado entende que é
impeachment não existe outra instituição para contestação. Assim como se a
Câmara entende que é admissível também.
Agência Brasil - Mas o governo
está recorrendo à Justiça...
Ibsen Pinheiro - O que o
Judiciário julga é o procedimento. Vou dar um exemplo: Ele poderá anular o
julgamento de domingo sim, se um dos eleitores for um suplente que não esteja
no exercício do mandato. Ai é causa de nulidade. Agora, pelo resultado, não há
controle judicial.
Agência Brasil - O senhor
acredita que, ao final do processo, Cunha poderá ser alvo de perseguição, como
o senhor foi no passado?
Ibsen Pinheiro - Não saberia
dizer. Prefiro escutar as opiniões dos analisas e dos jornalistas. Não saberia
dizer.
Agência Brasil
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